O governo não dá tréguas. A cada semana tira da manga medidas que vão formando um conjunto muito bem engendrado para retirar de trabalhadores e servidores públicos as possibilidades de ter uma vida digna. Fica cada vez mais claro o projeto do governo que, atolado em denúncias de corrupção, faz todo tipo de barganha para se manter no poder. Não titubeia em adotar ações, políticas ou medidas para espremer a classe trabalhadora, legitimar ilegalidades e beneficiar infratores e criminosos. Conta com a prestimosa colaboração do Poder Legislativo para alcançar sucesso.
O combate ao trabalho escravo é a bola da vez. E há muito tempo. A aprovação da Emenda Constitucional – EC 81, em 2014, tramitou por quase duas décadas e foi condicionada pela bancada ruralista a uma regulamentação que, na prática, nada mais é do que um projeto de redução do conceito de trabalho escravo inscrito no artigo 149 do Código Penal, atingindo a fiscalização e os trabalhadores. O projeto está parado, graças à resistência de quem está comprometido com a erradicação da escravidão contemporâneo. Mas impede que a EC 81 seja efetivada como um instrumento de punição aos neoescravagistas.
A Lista Suja, instrumento que muito incomoda os empresários por causa da exposição pública e da restrição a financiamentos, frequentemente é questionada na Justiça. No apagar das luzes de 2014 uma ação encontrou guarida no Supremo Tribunal Federal – STF que terminou por suspender a publicação do cadastro, sob fortes protestos da comunidade engajada no combate ao trabalho escravo. O Ministério do Trabalho, mesmo depois da liberação do próprio STF e de determinação judicial em ação do Ministério Público do Trabalho, dificultou o quanto pode o retorno da publicação. Somente em março desse ano a Lista Suja voltou a ser divulgada. A atualização do documento já foi entregue ao ministro do Trabalho há cerca de 15 dias, mas não foi ainda publicada.
O radical corte de orçamento da Secretaria de Inspeção do Trabalho promovido pelo governo este ano atingiu em cheio a fiscalização do trabalho escravo. As ações foram praticamente suspensas de agosto para cá. Já vinham minguando há muito tempo, especialmente devido à redução dos Grupos Especiais de Fiscalização Móvel, ou seja, havia uma ação precedente a prejudicar o andamento destas ações de fiscalização.
As denúncias expuseram o ministro e o Ministério do Trabalho a críticas. A resposta veio com a dispensa de André Roston do cargo de chefe da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo – Detrae. Dias antes ele tinha entregue a nova versão da Lista Suja que dorme sobre a mesa do ministro.
Agora, mais uma investida sobre o cadastro. A edição da Portaria nº 1.129/2017, no Diário Oficial da União de 16 de outubro, prevê que a Lista somente será publicada com autorização expressa do ministro do Trabalho, retirando a autonomia da área técnica. Nota do MTb alega que a medida “aprimora e dá segurança jurídica à atuação do Estado Brasileiro”. Para o Sinait, está formalizada a interferência na Auditoria-Fiscal do Trabalho.
A Portaria vai além. Altera conceitos de jornada exaustiva, trabalho forçado e condições análogas às de escravo, tentando fazer, na prática, o que o Congresso Nacional não fez. E restringindo as possibilidades de caracterização da situação de escravidão contemporânea por parte da fiscalização.
E avança. Sobre a independência dos Auditores-Fiscais do Trabalho. Determina que o flagrante de trabalho escravo só terá validade com boletim de ocorrência lavrado por policiais. Se o policial, por exemplo, não entender que é trabalho escravo, não haveria flagrante, não haveria auto de infração. Os Auditores-Fiscais do Trabalho, que têm por missão fiscalizar, estariam sendo fiscalizados. A autoridade trabalhista conquistada na Lei 13.464/2017 está sendo atacada.
Outras exigências são colocadas para que o auto de infração seja aceito, para dificultar a tramitação administrativa dos processos.
As mesmas dificuldades para a inclusão de empregadores na Lista Suja estão presentes para a concessão do Seguro-Desemprego aos trabalhadores resgatados do trabalho escravo. No cenário proposto pela portaria, poucos seriam os resgatados daqui por diante. Os explorados estariam mais explorados. Os miseráveis, mais miseráveis. Trabalho escravo e infantil, sem freio. É inadmissível.
Não há tempo para descanso. A luta bate incessantemente à nossa porta.
Diretoria Executiva Nacional do Sinait
17.10.17
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